Se o amor é cego, queria ao menos ser míope... Talvez assim pudesse contemplar este sentimento parcialmente. Sim, tenho dificuldade em amar. Digo “eu te amo”, quando poderia dizer “gosto de você”. Digo “eu te quero bem”, quando deveria dizer “eu te amo”. Não acho que isso seja a banalização do termo amor, mas antes tentativas nossas em querer definir e viver aquilo que é mais abstrato do que a nossa própria concepção de Deus; não é ao acaso que procuramos associar o nome de Deus a uma das variantes terminológicas do conceito de amor em Grego: “Ágape”. Em grego, este substantivo significa “incondicionalidade”, entretanto, julgo que o utilizamos em nossa tradição judaico-cristã, antes, para denotar justamente um sentimento transcendente, doravante abstrato. Enfim, tenho eu mesmo dificuldades em compreender, ou melhor, interpretar este conceito, seja o filosoficamente, seja vivencialmente. Só sei que quando gosto de alguém e quero-a bem em grau superior a uma mera obrigação moral/espiritual, costumo julgar que isso é amar... Talvez possa estar errado...ou não...
Então, porque a dificuldade em amar? Simples...não sabemos definir onde termina a amizade e começa o amor, onde começa a paixão e termina a amizade, ou como se sustenta a paixão, alicerçando na amizade para transcender no amor. Enfim...o amor aparenta-se com um verbo, corrente, fluido, que não se prende...a paixão ao contrário quer ver presa seu objeto, e a amizade, em sua displicência, se faz de livre mas não assume que quer um mínimo de exclusividade também. Conciliar amor, paixão e amizade, parece o trinômio perfeito de qualquer relação, mas a harmonia entre estas instâncias parece tão utópico quanto se apaixonar sem se apegar, manter uma amizade sem se relacionar, ou amar, na mesma proporção, um filho, uma esposa, deuses ou a natureza.
Destas dificuldades que temos (e que os gregos também se deparavam) julgo que a mais difícil de resolução é em relação à oposição/complementaridade entre “Éros” e “Ágape”, entre a paixão e a incondicionalidade, haja visto parecer caminhar mais razoavelmente a “Ágape” com a “Philia” (amizade). Estabelecer os limites claros entre este tipo específico de amor e a paixão é muito importante uma vez que nos ajuda a colocar as emoções em ordem, os sentimentos em hierarquias e as prioridades em relevância. Não se trata, portanto, de mera questão conceitual, mas antes, de urgência existencial. Sei que de uma paixão se pode derivar o amor incondicional, mas hoje tenho a convicção que depois que instalado o amor, nem sempre aquela paixão de outrora pode reviver com o fervor necessário para superar barreiras que a racionalidade ou o cotidiano emperra, na qual somente a pulsão voraz de uma carga extra de oxitocina pode fazer transpor. É por essa razão que os Gregos separavam muito bem conceitualmente o amor “Éros” do amor “Ágape”. Ambos não deixavam de serem amores, mas com doses, instâncias, motivos e expectativas distintas... o complementar ou dissociar, acabava por ser um mero capricho dos Deuses. Disto, quase estou tendo fé, dada minha imensa inabilidade.
Enfim, continuo refletindo sobre o amor...assim como penso diuturnamente em Deus. Não numa perspectiva religiosa, genuflexa. O que assemelha ambas as reflexões, por hora, é que a certeza de uma indefinição é muito mais evidente do que a expectativa de um resultado objetivo. Quando a razão não oferta mais explicações convincentes, para Deus, sobra a fé....para o amor, a esperança de vivê-lo em sua plenitude. Sigo amando (mal) seja lá o que esperançosamente isso realmente queira dizer. Não sei precisar ao certo os limites do amor e do “querer bem”, de ser verdadeiramente apaixonado e de ser tolo por deixar escapar por entre os dedos a verdadeira felicidade.
Taí, mais uma palavra a ser (in)definida: felicidade...
Será que a rotina juntos aos poucos consome e transforma o amor pleno em apenas carinho ou algo próximo disso? Belo texto ; )
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